CACHOEIRA DO SUL PREVISÃO

João Eichbaum

O Messias do Jair Messias

O povo brasileiro não sabia que o Supremo Tribunal Federal se entregava a banquetes imperiais. Mas ficou sabendo, porque aquela instituição, que deveria ser composta por pessoas comedidas, atreitas a espartana disciplina de costumes para manterem o cérebro saudável, abriu licitação, listando suas preferências gastronômicas. 

Os regabofes, chamados pomposamente de "refeições institucionais" englobam café da manhã, brunch, almoço, jantar e coquetel, e requerem produtos para pratos como bobó de camarão, camarão à baiana e medalhões de lagosta com molho de manteiga queimada. A farra gastronômica prevê também bacalhau à Gomes de Sá, frigideira de siri, moqueca e arroz de pato. Para homenagear a Bacco, há determinadas exigências. O vinho tinto seco tem que ser Tannat ou Assemblage, produzido com safra a partir de 2010. Mas, se for Merlot, a safra terá de ser 2011, ou posterior, contemplada com quatro premiações internacionais. Ah, exige-se também "cachaça de alta qualidade", e "whisky de malte envelhecido", decerto porque ninguém lá é de ferro.

Licitação desse tipo, num país em que há miseráveis morrendo de fome, não pode acalmar peitos e corações. Contra ela a deputada Carla Zambelli ajuizou uma ação popular. A doutora Solange Salgado, juíza da 1ª Vara Federal de Brasília, deferiu a liminar, mandando sustar a acintosa gastronomia.

Desse despacho, a União recorreu, e o desembargador Kassio Nunes Marques, do TRF da 1ª Região, em regime de urgência, cassou a decisão da doutora Solange. Num texto em que amontoa adjetivos, atropelando o vernáculo, o desembargador, botando o "eu" na frente, diz: "a mim não me parece que a impugnada licitação se apresente lesiva à moralidade administrativa". E desemboca numa conclusão sem construção axiológica: a licitação "se destina a qualificar o STF a oferecer refeições institucionais às mais graduadas autoridades nacionais e estrangeiras em compromissos oficiais nas quais a própria dignidade da Instituição, obviamente, é exposta..."

E julgou o próprio mérito, ele, sozinho, como se fosse um tribunal.

Quem carreia esse trôpego juízo, atrelado ao mau vernáculo, à margem de qualquer arremedo de Direito e sem a mínima base axiológica, porque ele próprio faz as vezes de premissa, é o ego: "a mim me parece". E a moral particular ("me parece") fica acima da moral impessoal (art. 37 da Constituição Federal) da República.

E aí, nessa República miserável, dividida entre políticos que enriquecem e pobres que não têm emprego, ganha emprego vitalício quem não prestou concurso e apregoa que, empanturrando ministros com guloseimas que pobre não conhece, se preserva a dignidade do Tribunal. Nada que faça esquecer as farras do império romano dos Neros e Calígulas.

Saiba que esse é o perfil do indicado para preencher uma vaga, que ainda nem houve, no STF. No advogado Kassio Nunes Marques, transformado em desembargador pela Dilma, Bolsonaro achou que cai bem a toga de ministro. E logo agora, quando o STF está precisando mesmo é de alguém que tenha a coragem da doutora Solange Salgado, para mostrar que o avesso do Direito não é a ilegalidade, mas a imoralidade.


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