Vegetação nativa
Pampa é o bioma brasileiro que mais perdeu vegetação natural
Michelle Khouri/JC imagem ilustrativa - fireção ilustrativa -
Um levantamento realizado pelo MapBiomas apontou que o Pampa foi o bioma que mais perdeu vegetação nativa nos últimos 36 anos. A rede colaborativa é composta de especialistas, universidades, ONGs, instituições e empresas de tecnologia. Na região do Pampa, o estudo é realizado em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e GeoKarten. O cálculo foi realizado proporcionalmente em relação ao total da área abrangida, e analisando os mais recentes dados do obtidos a partir da análise de imagens de satélite entre 1985 e 2020. Essa mudança afeta, inclusive, a rota migratória dos pássaros.
O decréscimo de 21,4% registrado entre 1985 e 2020 coloca o segundo menor bioma brasileiro à frente do Cerrado (-19,8%), Pantanal (-12,3%) e Amazônia (-11,6%). O Pampa funciona como um concentrador, para o qual convergem várias rotas de migração nacionais e internacionais. Por isso, a conservação das paisagens naturais do Pampa é crucial para múltiplas espécies migratórias da América do Norte, o sul da América do Sul e as regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil e o norte da Argentina,
O bioma Pampa, especialmente na sua porção leste, é considerado uma região de relevância internacional para diversas espécies de aves migratórias. A existência de um mosaico de ecossistemas naturais incluindo lagoas costeiras, praias, dunas, campos, matas de restinga e áreas pantanosas atrai uma notável concentração de aves em diferentes estações do ano, em busca de alimento ou de sítios de reprodução.
As espécies que se reproduzem no Canadá e Estados Unidos, voam para o Pampa no verão em busca de alimento. Já as espécies migrantes austrais voam até o bioma, onde permanecem somente no outono e no inverno. Elas partem desde a Patagônia, sul do Chile, Terra do Fogo e Ilhas Malvinas em direção ao Pampa no inverno, fugindo assim dos rigores do inverno austral. Outras espécies são residentes de verão e abandonam temporariamente o Pampa com a chegada dos meses frios para diversos destinos.
O avanço da ação do homem sobre a vegetação natural do Pampa acentuou-se na última década, quando também foi possível notar o começo da mudança do perfil econômico do uso do solo. Nos últimos 36 anos, o Pampa perdeu 2,5 milhões de hectares de vegetação nativa, que responde por menos da metade (46,1%) do território. Formações campestres ocupavam 46,2% do território em 1985. Em 2020, eram apenas 32,6%. Nesse período, a agricultura ganhou mais de 1,9 milhão de hectares de área do Pampa. A atividade, que ocupava 29,8% do bioma em 1985, passou a usar 39,9% do território em 2020. No ano passado, era o principal uso dos 44,1% antropizados do Pampa e segue uma tendência de crescimento alto a cada ano.
De acordo com o coordenador do mapeamento do Pampa, Heinrich Hasenack, "a substituição da formação campestre pela agricultura favorece a perda de biodiversidade e liberação de carbono na atmosfera, contribuindo para o efeito estufa. Mas é também um desvio de uma vocação econômica natural do Pampa".
Ele ainda explica que "ao contrário da Amazônia ou do Cerrado, onde é preciso desmatar para criar gado, no Pampa a vegetação nativa é um pasto natural, o que permite que a pecuária se desenvolva preservando a paisagem". Resultados de pesquisas mostram que práticas de manejo adequadas permitem retorno econômico similar ao do cultivo de grãos, com a vantagem de preservar a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.
O Pampa possui muitas espécies campestres por metro quadrado, mesmo quando ocupado por gado, favorecendo a conservação da biodiversidade e do carbono estocado. Embora a agricultura, de um modo geral, tenha ótima produtividade, em algumas circunstâncias acaba sendo introduzida em locais com menor aptidão do que a pecuária. Outro fato preocupante é que o Pampa tem a menor proporção de unidades de conservação dentre todos os biomas brasileiros, com apenas 3% do território protegido. Dos quais, se descontarmos as Áreas de Proteção Ambiental, uma categoria com menor grau de proteção, esse percentual cai para 0,6%. Existem regiões do Pampa que já estão excessivamente descaracterizadas, a ponto de colocar em risco a própria capacidade de restauração ecológica com as variantes genéticas típicas dessas regiões.
O avanço da agricultura sobre a vegetação nativa pode ser notado em todo o bioma, mas foi mais acentuado nas regiões da Fronteira Oeste, o Planalto Médio/Missões, Zona Costeira e leste da Campanha. Os cinco municípios que mais perderam vegetação natural nos últimos 36 anos foram São Gabriel, Alegrete, Tupanciretã, Dom Pedrito e Bagé.
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