CACHOEIRA DO SUL PREVISÃO

Boate Kiss

Júri condena os quatro réus, mas habeas impede prisão

Juliano Verardi/TJRS imagem ilustrativa - fireção ilustrativa -

Foi por volta de 17h45min desta sexta-feira, 10/12, que o juiz de Direito Orlando Faccini Neto iniciou a leitura da sentença que deu fim ao júri mais longo - e um dos mais aguardados - da história do Rio Grande do Sul. Depois de dez dias de julgamento, os quatro homens acusados por serem os responsáveis pelo incêndio da boate Kiss, em Santa Maria, receberam a sentença condenatória por homicídio com dolo eventual e tentativa de homicídio. Chegaram a ter a prisão preventiva decretada, mas um habeas corpus preventivo impediu que deixassem o salão do júri presos.

Os donos da boate, Elissandro Callegado Spohr (conhecido como Kiko) e Mauro Londero Hoffmann, o ex-vocalista da banda Gurizada Fandangueira Marcelo de Jesus dos Santos e o produtor de palco do grupo, Luciano Augusto Bonilha Leão, foram condenados por 242 homicídios consumados e 636 tentativas de homicídio.

O Conselho de Sentença, formado por seis homens e uma mulher, acolheu a tese apresentada pelo Ministério Público de homicídio doloso, pelo dolo eventual, quando mesmo o acusado sabe que suas ações podem causar morte e, mesmo assim, assume o risco de produzir tal resultado.

Para o Ministério Público Estadual, Kiko e Mauro assumiram o risco de matar por terem usado "em paredes e no teto da boate espuma altamente inflamável e sem indicação técnica de uso, contratando o show descrito, que sabiam incluir exibições com fogos de artifício, mantendo a casa noturna superlotada, sem condições de evacuação". Já Marcelo e Luciano foram apontados como responsáveis porque "adquiriram e acionaram fogos de artifício (...), que sabiam se destinar a uso em ambientes externos, e direcionaram este último, aceso, para o teto da boate, dando início à queima do revestimento inflamável e saindo do local sem alertar o público sobre o fogo (...), mesmo podendo fazê-lo".

As teses de defesa foram de que o dolo eventual não se aplica, pois, inclui que os réus não se importem com o resultado. Boa parte das defesas foi dedicada a tentar esclarecer as diferenças entre o dolo eventual e a culpa consciente, instrumentos jurídicos que muito se assemelham. "No dolo eventual, o agente não quer produzir o resultado, mas, se este vier a acontecer, pouco importa", alegaram, enquanto a "culpa consciente é aquela em que o agente, embora prevendo o resultado, não deixa de praticar a conduta, acreditando sinceramente, que este resultado não venha a ocorrer, não é assumido ou aceito pelo agente, que cofia na sua não-ocorrência". Sustentaram a tese que seus clientes não agiram com intenção, que o incêndio foi um acidente e que os próprios réus poderiam ter sido vítimas fatais.

Neste cenário, a defesa de Kiko Spohr, comandada pelo advogado Jader Marques, pediu a desclassificação do crime para homicídio culposo, que passaria a decisão de condenar ou não o cliente, às mãos do juiz presidente do júri. A defesa de Mauro Hoffmann, que desde o fato alega que era sócio investidor da boate e não tinha poder de mando na casa e não participava do dia a dia da boate, pediu a absolvição pela "audiência de ação" do acusado para contribuir com o crime; e alternativamente, a desclassificação para homicídio culposo. As defesas de Marcelo e Luciano pediram a absolvição dos réus, já que jamais quiseram produzir tal resultado.

O magistrado reconheceu que a sentença era muito extensa e não a leu por inteiro. Citou algumas partes - entre elas trechos do livro Todo dia a mesma noite, da jornalista Daniela Arbex, que fala sobre a tragédia da Kiss. "Apesar de tratarmos de dolo eventual, este, como tal, foi intenso e isso repercutirá no nível da aplicação da pena", disse o Juiz. "A culpabilidade dos réus é elevada, mesmo se tratando de dolo eventual", acrescentou. No momento da leitura, dos réus, somente Kiko e Mauro estavam presentes no plenário, acompanhados de seus advogados. Os advogados de Luciano e Marcelo também estavam presentes.

Kiko, o sócio administrador da boate e que admitiu ter comprado e mandado instalar na casa a espuma que queimou, dando origem ao fogo naquela noite, recebeu a maior pena: 22 anos e seis meses de prisão. Mauro foi condenado a 19 anos e seis meses de prisão. Já os integrantes da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo e Luciano, receberam sentenças de 18 anos de prisão. Para todos, o regime inicial fixado foi o fechado. Faccini Neto disse ainda que se cabia a liberdade provisória aos réus e que "é inexplicável para o senso comum que o acusado condenado pelo júri, mormente quando a pena é expressiva, tenha para si nenhuma consequência após o julgamento, como se nem o julgamento tivesse havido", decretando a prisão preventiva dos quatro. "Estou decretando a prisão dos quatro e pedindo que se observe a dispensabilidade de algema e que sejam conduzidos com toda a dignidade", disse o magistrado.

Foi neste momento que o advogado Jader Marques informou a concessão pelo Tribunal de Justiça de um habeas corpus preventivo que havia sido impetrado em favor de Elissandro. Ao tomar conhecimento da decisão, Faccini Neto a acatou. "Mantenho inteiramente minha decisão, entretanto, tendo em vista a comunicação de concessão de HC preventivo em favor dos réus suspendo a execução da decisão que proferi", disse, estendendo os efeitos do Habeas Corpus aos quatro réus.

Cabe recurso da decisão do júri, tanto para defesas quanto para o Ministério Público.


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