BRIANE MACHADO
Ponteiros da vida
Você já parou para pensar em como o tempo afeta a vida em todos os âmbitos? Em como dependemos da organização do tempo para que determinado compromisso seja efetivado ou para que consigamos desempenhar uma tarefa agendada? Ocorre que, desde a expansão da revolução industrial (séculos XVIII e XIX), a humanidade permanece pautada pelas voltas que os ponteiros dão no centro do relógio. Isso porquê, na era da indústria, a acepção do tempo passou a ser unívoca a produtividade. Contudo, desde o final do século passado, foi acrescentada uma nova palavra ao vocabulário do mais recente indivíduo pós-moderno, a expressão é: desempenho.
No teatro ou no cinema, desempenhar um papel, significa o modo de representa-lo e ser percebido. Portanto, o atual sujeito produtivo precisa ser célebre e notável em sua sociedade e seu desempenho deve ser reconhecido e, por conseguinte, coisificado. Por isso, o sujeito de desempenho pode adoecer através de uma exposição demasiada e ausência de introspecção. Torna-se, acrítico, fetichizado e reduzido a sua própria imagem.
Apesar disso, de acordo com o filósofo Byung-Chul Han, na realidade, o que torna este indivíduo doente, não é o excesso de responsabilidade e iniciativa, mas o imperativo do desempenho como obrigação da sociedade pós-moderna (HAN, 2017). Responsabilidade e iniciativa constituem valores éticos e, deste modo, universais, não obstante, a constante busca e publicitação do desempenho também se compara àquilo que Han chamou de Burnout Psíquico (HAN, 2017). Ademais, ter tempo é estar livre para si próprio. Cuidemos do tempo, para cuidar-nos e, consequentemente, realizarmos bem o nosso trabalho, com imersão e dedicação.
Mas será que diante de tantas mudanças sociais temos direito ao tempo? Seguindo os preceitos de François Ost, vivemos em quatro tempos: memória, perdão, promessa e questionamento (OST, 2005).
A memória liga o passado e, podemos observar tal desligamento através de um idoso que se lembra de sua infância como se tivesse vivido aqueles acontecimentos ontem pela manhã, mas que esqueceu o que almoçou hoje.
Quando falamos em perdão, desligamos aquilo que uma vez nos fez sofrer ou repensar o que aconteceu. Ele possibilita uma promessa de futuro.
Se nos questionarmos, estaremos desligando o futuro, até que as dúvidas sejam dirimidas no consciente.
Estamos o tempo inteiro em contraponto com o que foi e o que será. Vivemos por segundos, os quais estão todos no passado e nem percebemos.
Para os amantes do universo, cada vez que olhamos para o céu estamos observando o passado.
Quando admiramos a lua, estamos enxergando cerca de 1,2 segundo no passado; a luz que deixa o sol leva cerca de 8 minutos e 20 segundos para chegar até nós.
O tempo passado nos habilita para o presente e nos impulsiona ao futuro, isto é, nas palavras de Leandro Karnal, "não há ser humano que domine o futuro", cabe a nós vivenciarmos o presente de forma que acrescente ao futuro aquilo que almejamos e, de certa forma, não estamos preparados para tê-lo agora.
Talvez, a gestão do tempo precise mais do que organização, mas de resiliência e adaptação para que tudo seja colocado em seu devido lugar.
Em tudo que vemos, em toda e qualquer matéria que está ao redor, foi preciso tempo e transformação, tal qual nós, humanos, precisamos de evolução e da atmosfera precípua para que os ciclos sejam completos, que a metamorfose aconteça e que o passado seja visto como o caminho para o futuro.
*O texto foi escrito com a colaboração de Jeremyas Machado Silva, professor e doutorando em História.
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